segunda-feira, 17 de maio de 2010

A última chance do Irã


Definitivamente, os tempos estão mudando. Até o presente momento, as negociações entre Brasil, Turquia e Irã parecem estar tendo um inesperado sucesso. O Irã, acusado pelo ocidente de planejar desenvolver um programa nuclear com fins militares, aceitou enriquecer seu urânio na Turquia, até uma porcentagem que os impediria de desenvolver armas nucleares.
Talvez o mais surpreendente desse acordo não seja a posição do Irã, que agora parece aceitar o enriquecimento do urânio fora de suas fronteiras, mas sim os protagonistas envolvidos. O fato de em uma negociação internacional tão importante ter excluído qualquer ator ocidental, demonstra que o balanço de forças no mundo está mudando.
Os críticos do acordo têm razão em terem cautela sobre os reais resultados deste, afinal, Teerã já retrocedeu a acordos anteriores. Apesar disso, a ausência do ocidente nas negociações parece ser o verdadeiro motivo desse ceticismo. Os últimos acontecimentos têm demonstra a mudança no mundo e os líderes desses países têm reagido como cientes disso.
As críticas e o ceticismo não precisam necessariamente virem juntas. Ceticismo pode vir acompanhado de esperança, mas ao invés disso os membros europeus do Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha desprezaram o resultado do encontro dos três países. Faz sentido pedir-se um acordo e quando ele é concretizado desprezá-lo? Tais comentários podem ser vistos mais como mesquinhos e até invejosos do que como céticos. Um comportamento mais saudável foi o do almirante norte-americano James Stavridis, que viu esperança em uma solução diplomática, apesar de crer que a “nós temos um milhão de milhas pela frente” ainda. Posição equilibrada. Ceticismo e esperança.
Antes da sentida ausência ocidental, teve lugar o fracasso desses países em imporem sua vontade e a falta de autoridade moral, visto serem quase todos possuidores de armas nucleares. Não é de se admirar do fracasso dos países ricos, pois depois de invadirem dois países muçulmanos, Afeganistão e Iraque, isso sem contar com cem anos de imperialismo no Oriente Médio (o tempo é maior, mas estou contanto apenas do fim do império turco otomano, logo após a I Guerra mundial) estranho seria se o Irã confiasse em europeus e norte-americanos.
É de se notar que tudo isso acontece no mesmo momento em que a Grécia ameaça quebrar a promessa do Euro e que o Brasil empresta dinheiro (pouco, é verdade) para o pacote do FMI para salvar a Europa. Como aconteceu em Roma, na Antiguidade, até a natureza ajuda a acentuar o declínio europeu com a erupção do vulcão islandês que trouxe prejuízos de bilhões de euros, ops, acho melhor contabilizar em dólares, de bilhões de dólares à aviação e à economia européia em geral.
Resta agora saber se Mahmoud Ahmadinejad será pragmático o suficiente para evitar a guerra e o sofrimento do seu povo aproveitando essa oportunidade única de sair pela porta da frente, com dignidade. Se cumprir o acordo, o Irã será poupado da destruição e ainda dará um tapa de luva na cara da diplomacia ocidental que ficará conhecida, nesse episódio, como sendo truculenta e ineficiente, além de coroar o Brasil e a Turquia como novos players. Além de desmoralizar o ocidente, ansioso por mais uma guerra, aumentar o poder dos países emergentes e salvar seu povo de muito sofrimento, cumprir o acordo também dará uma oportunidade de sair de cabeça erguida, como quem diz: “agora que pediu por favor eu faço, só faltava a palavrinha mágica”. Mas se Ahmadinejad insistir em enriquecer o urânio em seu país, nas suas centrífugas, ele atrairá a guerra, destruirá o regime teocrático xiita e terá uma boa razão para o ocidente sair disso tudo como o campeão de uma guerra justa. Na segunda hipótese o ocidente vence e os emergentes perdem, principalmente Brasil e Turquia, mas quem perde mesmo é o povo do Irã. Mais do que nunca, a paz é um bom negócio, torçamos por ela.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Política brasileira: novos temas e novos atores


O cenário político brasileiro está se diversificando, está se modificando. Com a ascensão da economia brasileira e a mudança nos costumes e na religiosidade do país, a tendência é que surjam novos atores e outros adormecidos reapareçam.
Quando se fala em política, no nosso país, se pensa automaticamente em como a economia será conduzida. A principal issue é se o Estado deve intervir muito ou pouco. Em outros países a política é algo mais amplo. Nos EUA, por exemplo, a política externa e as moral issues, questões morais, como aborto, casamento gay, eutanásia recebem importância especial.
Nos próximos anos é possível que justamente nessas duas áreas, a política internacional e as moral issues recebam mais atenção na formulação das agendas políticas e eleitorais no nosso país. Vejamos o porquê de tudo isso.
Nesse governo, aconteceram três coisas muito interessantes: a economia brasileira cresceu; a crise internacional diminuiu o poder econômico e por extensão militar de muitos países ocidentais, como a Inglaterra, por exemplo, obrigada a abaixar o orçamento militar; e o Presidente Lula se mostrou extremamente carismático e amado no exterior. Esses três fatores combinados deram a esse governo uma projeção internacional muito grande, de modo que o Presidente Lula é considerado por muitos o maior estadista que o Brasil já teve.
É, aliás, um grande erro da campanha de Dilma Rousseff não investir nesse filão. Se a pré-candidata petista se ligar ao Presidente não só na imagem de boa gestora, mas também na de estadista, levará o voto dos nacionalistas.
Esse nacionalismo tende a crescer se os bons resultados da economia e da diplomacia continuarem. Prova disso é o lançamento do filme “Segurança Nacional”, onde a Abin tenta impedir um ato terrorista contra o SIVAM. No filme, o presidente é um cara durão que comanda um país com caças e serviço secreto. É interessante vermos o nosso país num filme nosso em que nossas instituições não são ridicularizadas, como costuma fazer nossos geniais cineastas. Para o bem da pátria, claro.
Além da política externa, vemos também o aparecimento de uma arena nas moral issues, chamadas em português de “Questões Morais”. Isso se dá por que os atores envolvidos nessas questões cresceram dos dois lados. De um lado o movimento GLS, ou GLBTT, que por causa do espaço recebido da mídia tem atraído a simpatia de muitos, aliados a grupos feministas, afro-brasileiros e “libertários” de uma forma geral. É a nova esquerda.
Percebe-se também o aumento das igrejas evangélicos e de seu capital eleitoral. A própria existência de leis anticristãs (termo evangélico) ou libertárias (termo libertário) já é um fator de legitimação para a existência da bancada evangélica. A existência dessas leis deve, paradoxalmente, aumentar a presença evangélica na política, além de manter os católicos no páreo. Nunca é demais lembrar que os libertários conseguiram o que nenhum ecumênico estava conseguindo: juntar católicos e evangélicos no mesmo barco, segurando a mesma bandeira e “amando-se mutuamente”.
Aparentemente nessas eleições essas mudanças não vão se fazer ainda. Não no nível presidencial, mas no legislativo é capaz de uma pequena amostra dessas tendências começarem a aparecer. A imprensa e os presidenciáveis não perceberam ainda a potencialidade eleitoral dessas mudanças, mas com o passar do tempo poderemos assistir a um aumento do leque do que é considerado um legítimo tema político. A política no Brasil parece estar ficando mais ampla e muito mais interessante também.